terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Texto MUITO Grande !

 - Voltei a lê-lo ...
Gosto especialmente do facto de ter só 14 anos quando o escevi . Não é que tenha passado muito tempo , mas é significativo .
Para muita gente pode não passar de um texto ficticio "engraçadito e com algum assunto" mas para mim tem recordações únicas : ter feito pessoas que desconhecia chorarem apenas com as minhas palavras , ter o total apreço , pela primeira vez , da minha mãe , ou mesmo ter ficado em 2º lugar num concurso de escrita criativa .
Pode ser ficticio , pode não passar de um texto de uma criança ... mas não são assim todos os textos ? Imaginados e pensados no mais infimo do nosso interior ? Onde vamos buscar o que há de mais infantil e de mais maduro em nós ? Eu não sou excepção ...


Carinho ...

-Mãe, tenho um formigueirozito no coração, e se pudesse dizia-te o que sinto, como sinto, da maneira que me afecta, do que me afecta…


-Mãe, que parte de ti ainda me pertence, que segredos revelam os teus olhos, de que é feito o teu coração?

-Mãe, o teu céu é grande como o meu? É azul como o meu? Tem nuvens como o meu? Tu tens céu?

-Mãe, há quanto tempo não te sinto, não me dizes o que digo, não pensas o que penso, não sonhas o que sonho?

-Mãe, sinto um formigueirozito no pé, e se pudesse dizia-te como é, porque me faz andar e nunca mais parar…

-Mãe, será que me ouvias? Que me davas o teu ombro e sorrias?

-Mãe, tu já não estás cá…

-Mãe, era aquele sentimento que eu sentia quando te via, aquele que me fazia correr, saltar para os teus braços, abraçar-te e enroscar te muito no meu peito, ou será que era eu no teu?

-Mãe, era aquele formigueirozito que não me deixava estar quieta, quando olhavas discreta, e me ordenavas a parar…

-Mãe, era aquele sorriso perdido, de quando perdi um amigo, levado assim…

-Mãe, tu já não estás cá….

Será este o motivo do meu formigueirozito? Aquele que eu sentia quando te via, aquele que me deixava com um sorriso de parva por te ver, aquele que me abria as portas da vida e me dava vontade de viver?

E me fazia voar… como um passarinho! Não um passarinho qualquer… eu era um canário, mãe, eu era o teu canário, o teu sorriso, o teu Carinho!

O mesmo Carinho que entrou assim, como o vento, no meu coração (também entrou no teu?) com as patinhas bem pousadas no chão, ou na tua mão, ou no ar, sereno a voar.

O mesmo Carinho que da mesma maneira que entrou, não se importou de sair, e partir.

Era a Lua que numa noite segura, teimava a aparecer, a menos que fosse Lua Nova, e iluminava o teu olhar, branco mar… mas não era uma Lua qualquer, eu era a Quarto Minguante (ou seria a Quarto Crescente?) mãe, eu era a Tua Lua.

O mesmo Carinho que se desenhou no teu céu (se é que o tinhas) e se transformou numa nuvem com a minha silhueta, aquela em que tu reparaste e eu a olhava de boca aberta, imaginando-me careca ou a transbordar de cabelo. Mas não era uma nuvem qualquer… eu era aquela no centro do mundo pronta para olhar para tudo.

O mesmo Carinho que iluminou o teu sorriso com o Luar mais bonito a falar para ti. E quando olhaste em redor e viste aquele pontinho, minúsculo, pequenino, tão nítido e quase impossível de ver, viste-me a mim, quando ainda não me conhecias, nem o meu sorriso vias. Aquela estrela que te fez fechar os olhos com o seu brilho incandescente e te fez adormecer docemente, sonhando comigo (será que era mesmo eu?) apenas como amigo, pois não sabias que era uma menina, bem formadinha, dentro da tua barriga. Mas eu não era uma estrela qualquer, eu era a estrela do centro do céu, do teu céu (se o tivesses) aquela para onde olhavas todas as noites, mãe, eu era a Tua estrela.

E sem dúvida o motivo porque me imaginas com os olhos cor de mel e os cabelos raios de sol, que tu acariciarias, um dia, se não tivesse nascido num mundo tão cruel.

Eu ia nascer sozinha, e ir para a escola e ver, que todos iriam crescer, aprender, contar e escrever, como eu um dia faria, se não tivesse nascido num mundo de rebeldia.

Foi naquele dia, quando me deixaste pela primeira vez, á porta da escola. Era a vez de eu conhecer o 2º ciclo. Pus um pé dentro de escola e fui assaltada por imagens horrendas. E lá se foram roubadas as minhas ilusões de um mundo perfeito, imagens pacatas e serenas. Foi quando vi, que amigos lutavam e pessoas amigas umas das outras pelas costas mal falavam. Mãe, eu não quero viver aqui.

E foi quando te disse que ali já não voltava que tu me disseste que o meu mundo já não existia, que não era uma criança, que não existia magia, já não havia mais aquela lembrança.

Foi quando eu comecei no teu peito a chorar, que me juraste ser verdade, e falaste de todas as contas que tinhas de pagar. Água, luz, casa, carro e gás. Mãe, eu não quero viver aqui.

E horrorizada com isto tudo, como se não bastasse, disseste que não podia escolher outro mundo, e mesmo que me afastasse, tudo voltaria a encontrar-me outra vez, mesmo sem eu querer, mesmo contra a minha vontade.

Abordaste-me sobre os assuntos de que devia fugir, a maneira como devia reagir, quando todo aquele mal me atacasse.

Que me devia defender, e matar para não morrer, para nunca de ninguém sentir saudade!

Mãe, tu erraste!





Criticaste quem eu gostava pois dizias que aquele que eu amava me magoava. Mãe, eu desisti.

Rasgavas tudo aquilo que eu construía pois dizias que era de fantasia e havia muita magia.

Destruíste tudo aquilo que eu fiz riscando-me como a um quadro de giz, não querendo tudo o que eu quis.

Ofendias tudo aquilo que eu queria pois dizias que não crescia e por vezes parecia de ideias sub-nutrida.

Mãe, tu magoaste-me!

E foi por esse medo que perdesse, que mal me tratassem e o teu Sol ferissem, que fizeram com que o Carinho desaparecesse.

Foi pela janela e voou. Para bem longe de mim. Pois quando eu desci as escadas, já tu deitada te encontravas, no meio da estrada, cercada, pelas pessoas que me queriam abater.

Já não podia gritar “mãe, mãe, volta para mim”. Podia apenas rezar, para que lá no sítio onde estivesses olhassem bem por ti.

Já não podia chorar com as melhores lágrimas e de toda a cor, podia apenas cantar a tua melodia preferida, aquela do amor.

Já não podia para ti falar as melhores frases e com muito mimo pois agora nunca mais na minha vida, voltaria a ter o teu Carinho.

E dizia à bocado “pelas pessoas que me queriam abater”? pois foram essas pessoas que te fizeram morrer, e me deram vontade de viver.

Tiraram-te de mim, e de tudo o que era teu.

Foi como tirar um pedacinho de nuvem ao céu.

Sei que não fazia isto há anos, não te felicitava devidamente e respondia-te pelos meus danos. Mãe, eu não os cometi. Foram eles, ao tirarem-te de mim.

Uma vez, mesmo quando já estavas com Jesus e os anjos, eu vi-te. Preparavas o meu lanche, punha-lo na minha sacola, e nem aí eu tive a coragem de te dizer, de te falar da raiva que tenho em mim por quem te matou:

-Mama, eles andam na minha escola!

De certeza que querem ser assim?

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